quinta-feira, agosto 31, 2006

Poesia Concreta, Prosa Caótica: Ótica Futura

A CAETANO VELOSO

Sexo vai, sexo vem

O arfar ululante da caixa torácica
E curva coluna em arco-e-flexa
A boca que ri, o olho que fecha
Natureza sua morena passe cá.

O calafrio ao toque suave quente
De calor pulsante de amante nu.
O corpo-coral que sobre si sente.
E a língua estúpida: sururu.

E é tudo. É perna, pêlo e cabelo.
E a chama fria que queima é ente
E quem há de pensar não sê-lo?

E o fio vermelho corre no dente,
Mostra única e macabra do desejo,
É fio de sangue que corre quente


Ao beijo.

quarta-feira, agosto 30, 2006

Cobra Coral



A CAETANO VELOSO

terça-feira, agosto 29, 2006

S.O.S Urbano: Busca Lenta, Insuportável, Mas Eclâmptica


Saiu de casa disposto a encontrar numa destas cidades grandes, ou melhor, enorme, cinza, com grades, algo sublime que pudesse admirar. As calçadas e o asfalto ferviam ao sol enlouquecedor do meio dia. As imagens se diluíam com o calor que se sentia. E tudo era cinza em tonalidades diferentes que compunham as imagens em linhas retas e entediantemente paralelas. As tosses que ouvia lhe eram som ambiente junto com as batidas simétricas dos motores e, por ventura, gritos, por vezes, dores dos horrores e fumaça feia apagando a visão. Os seres desumanizados trajando preto ou branco rendiam a paisagem mais tons de cinza e menos vida nos guetos e nos retos prédios que cortam o céu em tiras. A única forma curva, o Sol é engolida pelos arranha-céus. O espaço de aço e concreto é tomado pelas sombras. Os cinzas escurecem e beijam o negro. Cansado e triste pela busca frustrada o poeta de musa atada, mutilada e estuprada volta a sua torre de marfim de cabeça baixa pensando: “É o fim”. Mas eis que, por ironia divina, encontra o que procura escondido no acaso. Num montinho de cocô possivelmente de algum cachorro de madame cresce tímida e ingenuamente uma plantinha minúscula, com uma florzinha branca amorfa e um caule verde vida. Resiste ao cinza, à reta, à simetria, à grandeza, à interatividade, à inanimação. O poeta cai de joelhos para contemplá-la tirar dali seus versos exaustos da busca, mas felizes pelo encontro. Kataplash! Uma bota gigante e preta pisa sobre o objeto estético. Uma idosa obesa e mal encarada com um pacote bege entre os braços, dona da bota, bota o olhar sobre o que fez, diz um palavrão impublicável, arrasta os pés calçados na calçada para limpar-se. A delicada plantinha é reduzida a nada. Os olhos enchem de lágrimas. Um caminhão passa levantando poeira. Lágrima e poeira viram lama. É o fim.

segunda-feira, agosto 28, 2006

As cores que pintam o mundo são as mesmas que pintam minha alma

As cores que pintam o mundo são as mesmas que pintam minha alma.
As cores das faces das crianças são as cores de meu rosto ideal.
As cores das cascas das laranjas são as mesmas de meu sentir.
As cores, tão lindas, em minha retina reluzem e transcendem.
As cores dos troncos crespos são o som de minha respiração.
As cores do asfalto são as cores dos meus olhos arregalados.
As cores do vestido da menina correm em minhas veias.
As cores nas rugas de minhas mãos são a mesma dela.
As cores de meus cabelos tingem o mar à noite.
As cores na tela do cinema colorem meu ego.
As cores nas penas da ave chacoalham-se.
As cores nas rosas sorriem para mim.
As cores colorem a existência.
As cores falam.
As cores.
Cores.
Cor.

Grande Nuvem Azul em Movimento

Eu sentado no ônibus. O sono chega e senta ao meu lado... durmo...sonho. Um casal de idosos ocupam os lugares a minha frente, a mulher branca, com os cabelos grisalhos e curtos, com diversas gotas grossas d’água que não lhe penetram fio adentro; o homem negro. Ela com seu olhar de cinqüenta-anos-de-submissão-calada ouve o marido xingando-a mais uma vez em voz alta. Um obeso passa vendendo balas, enquanto um garotinho olha para a bunda de uma loira que com dificuldade segura no metal do veículo. Um rapaz atravanca o corredor, pois fica bem no meio para que ninguém o roce, enquanto, mais atrás, um outro está todo torto para que alguém o faça. Um grupo de cinco homens, vestidos com algo que lembra caubóis, ri desvairadamente de algo que aparentemente não têm graça alguma. No fundo, um bêbado resmunga e as pessoas ao seu lado tapam os narizes para se proteger dos odores que ele emite. Um grupo de estudantes de enfermagem canta baixo uma música do Chiclete com Banana. Uma senhora elegante chora sozinha e discretamente olhando pelo vidro a chuva cair fina e tristemente lá fora.

“Que sonho louco!”, penso. E alguém me diz ao ouvido: “Ei, acorde, não é um sonho!... E pense mais baixo”. E eu acordo e percebo que realmente a vida acontece todos os dias, bela. Mas poucos percebem, pois estão dormindo.

(Música. Entram os comerciais.)

O Bem e o Mal tem medo da maçã

Certa vez entrou em meu quarto um diabo triste e só (o diabo de Nietzsche). Olhou para mim com olhos de brasa e disse: “Você terá que viver essa vida por infinitas vezes: cada dor, cada prazer. Tudo sempre igual, as mesmas pessoas, os mesmos erros, as mesmas situações. Tudo e todos iguais para sempre, se repetindo num círculo sem fim. E, então verá que ela não é tão boa assim”. E eu olhando de volta encarando-o despretensiosamente sem nem mesmo me levantar de onde estava lhe respondi: “Você também”. E o diabo saiu mais triste e só do que quando entrou.

“Transcendência” ou “O sussurro de um anjo barroco”



“...onde pisas no chão minha alma salta e ganha liberdade na amplidão”. (Caetano Veloso)

1

Tudo pode nos espantar se parar-mos para ver e contemplar. Assusta-me o fato das pessoas não perceberam como tudo no mundo é estranho e misterioso. Como algo se esconde por traz de tudo. O fato é que já se acostumaram com essa realidade dita material. Reparei hoje uma enorme árvore seca, sem folha alguma, sob um céu azul intenso imaculado de nuvens. Essa cena me pareceu tão surreal, como um quadro de Dalí. Experimente isso hoje: olhar algo pela primeira vez. Vai entender do que eu falo.

2

Seguimos calados a nossa viagem cósmica pelo universo neste enorme Transcol azul giratório chamado Terra, por uma estrada negra cheia de pontos brancos que vai do nada ao nada. Alguém no fundo grita...

3

As canções de hoje são os ecos das de outrora. Saíram das fábricas e roubaram à fábrica (graças a Deus!) e as musas. AHHHHHHHHH! OOOHHHH!!! Uhhhhhh! Ficamos aqui grunhindo procurando o poema enquanto reviramos o lixo do passado a procura de uma rima qualquer ou um pedaço de métrica que nos sirva para a refeição do dia enquanto os dias não melhoram. Talvez eu vá às compras pra esquecer. Eu tenho meu estilo pessoal e de época, a Renner tem todos.

4

Os mastros onde tremelicam bandeiras laranjas espalham-se pelas praças simétricos e chatos. Todos iguais, todos da mesma cor, da mesma forma, da mesma textura, dos mesmos olhares, dos mesmos cânceres. Vamos sorrir desdentados, falar alto e expor ao mundo toda nossa falta de charme.

5

Tomara que leões invadam as cidades e devorem todas as pessoas ocupadas em construir um mundo que não são delas. Devorem aqueles que constroem para outros. Afinal, elas também precisam de alegria.

6

Já não importa se nasceste honrado. Tire um maço de dólares do bolso e pode enfiar um punhal de aço em meu peito. Depois pode ir chorar à Bíblia junto ao ar-condicionado.

7

Matei 5 horas de minha vida em frente ao espelho. Agora corro atrás de 5 horas novas que nunca encontro. Talvez tenha ficado atrás de algum.

8
Certa manhã seremos atropelados pelo Sol. Tudo será destruído (até o que é indestrutível). Sairemos daqui para ali. Transcenderemos.

sexta-feira, agosto 25, 2006

Recôncavo Poético

...a poesia deste momento inunda minha vida inteira. (Carlos Drummond)


O humano desumanizado e re-humanizado
Nos movimentos dos cubos beges.
Apareço na tela e percorro todo o globo
Num instante, som instantâneo.
Não estou em lugar nenhum
Eu não sou ninguém
Na existência inexistente da existência-pixel.

Eu estou no texto
E o texto não existe.
O texto é luz.

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